Falta de vacinação pode causar retorno de doenças, diz especialista

Já foram registrados mais de 10.200 casos de sarampo, doença que havia sido eliminada em 2016.

Por Ariane Abreu | FOTO: Divulgação / Internet

Muita gente pode não saber, mas, além da febre amarela, que causou um sério problema de saúde pública nos últimos anos, outra doença tem deixado as autoridades em alerta no Brasil. Estamos falando do sarampo, doença que estava anteriormente eliminada e que agora voltou a circular por algumas regiões do país.

De acordo com dados divulgados pelo Ministério da Saúde, são mais de 10.200 casos já registrados. A maioria deles está concentrada em estados do norte, como Amazonas, Pará e Roraima. No entanto, o sarampo reapareceu também em outras regiões, tendo registros da doença no Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo, Sergipe, Pernambuco, dentre outras cidades.

O sarampo é uma doença infecciosa, transmissível e extremamente contagiosa, podendo evoluir com complicações e levar a morte, particularmente em crianças desnutridas e menores de um ano de idade. Segundo o Ministério da Saúde, a transmissão ocorre de pessoa a pessoa, por meio de secreções respiratórias, no período de quatro a seis dias antes do aparecimento de manchas na pele, até quatro dias após.
Nos últimos anos, casos também têm sido reportados em várias partes do mundo e segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), os países dos continentes europeu e africano registraram o maior número de casos da doença. O Brasil, apesar de ter registrado casos em 2015, recebeu o certificado de eliminação da circulação do vírus do sarampo pela OMS em 2016, declarando a região das Américas livre da doença.

Já a febre amarela, mais comum na região amazônica, causou um surto entre os anos de 2016 e 2017, quando os casos também foram registrados no sudeste, centro-oeste e nordeste do país. Ela se caracteriza por ser uma doença infecciosa febril aguda, causada por um vírus transmitido por mosquitos vetores, e possui dois ciclos de transmissão: silvestre (quando há transmissão em área rural ou de floresta) e urbano.

O vírus é transmitido pela picada dos mosquitos transmissores infectados e não há transmissão direta de pessoa a pessoa. A febre amarela tem importância epidemiológica por sua gravidade clínica e potencial de disseminação em áreas urbanas infestadas pelo mosquito Aedes aegypti. Por isso, o quadro se agrava em regiões cuja infraestrutura de esgoto e saneamento básico é mais precária, permitindo a proliferação rápida do mosquito.

Uma das principais diferenças entre a febre amarela e o sarampo, portanto, é a transmissão. Enquanto a febre amarela depende do mosquito vetor infectado, o sarampo revela-se altamente contagioso, porque pode ser transmitido por um espirro ou pela respiração da pessoa contaminada. Ambas as doenças, no entanto, causam preocupação entre os especialistas da área da saúde.

Foi para alertar aos caminhoneiros e suas famílias sobre a necessidade de manter atenção redobrada com a saúde que entrevistamos Ariane Abreu, Bacharel em Saúde Coletiva e mestranda no Núcleo de Avaliação de Tecnologias em Saúde do Instituto Nacional de Cardiologia, no Rio de Janeiro. Confira na íntegra a entrevista.

Chico da Boleia: Ariane, recentemente temos visto reportagens alertando para o retorno de algumas doenças já controladas anteriormente por vacinas no Brasil. Quais são elas e a que se deve essa situação?

Entrevista com Ariane Abreu, Bacharel em Saúde Coletiva e mestranda em avaliação de tecnologias em saúde do NATS/INC
Foto: Arquivo Pessoal

Ariane Abreu: Atualmente temos como preocupação o aumento de casos de duas doenças imunopreveníveis no Brasil, a febre amarela e o sarampo. Os casos de febre amarela vêm aumentando no país desde 2016. Antes, a doença possuía uma circulação endêmica na região norte e centro-oeste do país, principalmente nas regiões de mata. Desde então, novos casos da doença avançaram para a região leste do país no sentido do litoral, área anteriormente considerada sem casos da doença. Hoje, o Ministério da Saúde realiza campanha de vacinação em todo o território nacional com o esquema de 1 dose da vacina, suficiente para garantir a imunidade contra a doença. É importante ressaltar que ainda não foi confirmada a circulação de casos urbanos da doença.

Já o sarampo, que é considerado eliminado no país desde 2016, ressurgiu em 2017 na região norte do país, através de casos importados de vírus da mesma linhagem da Venezuela. O aumento rápido dos casos da doença no Brasil ocorreu devido à baixa cobertura vacinal contra a doença. Atualmente já são mais de 10 mil casos confirmados da doença e 13 mortes no país.

CB: E no caso dos caminhoneiros, que percorrem o Brasil todo, a quais riscos eles estão expostos?

AA: Por circular em todo o território os caminhoneiros podem ser expostos as duas doenças, por isso é importante que estejam vacinados contra as mesmas. Hoje os casos de febre amarela ocorrem em regiões de mata ou limítrofes a estas e a doença é transmitida por mosquitos. O sarampo é altamente contagioso e é transmitido pelas secreções humanas através da tosse ou espirros. Para a febre amarela basta 1 dose da vacina para garantir a imunidade. Já para o sarampo pessoas até 29 anos devem tomar 2 doses da vacina e as de idade entre 30 a 50 anos 1 dose.

Ambas as vacinas são disponibilizadas gratuitamente pelo Programa Nacional de Imunização brasileiro nas unidades básicas de saúde que possuam sala de vacinação. É importante também que os caminhoneiros que cruzam as fronteiras com outros países sejam vacinados contra a febre amarela e que possuam o certificado internacional de vacinação. Ele é solicitado para a entrada em vários países da América Latina. Para saber o local mais próximo para emissão do certificado basta consultar o site da ANVISA. Também é importante alertar a família para que todos se vacinem.

CB: Existem outras doenças que podem retornar, caso a população não atente para a vacinação das crianças?

AA: Infelizmente, nós que trabalhamos com vacinas costumamos dizer que elas são tão eficientes que são inimigas do próprio sucesso. Conforme os casos das doenças diminuem e são eliminados ou controlados, com o tempo, as pessoas se esquecem do mal que as doenças costumavam fazer. Além disso, hoje no Brasil as coberturas vacinais seguem em queda desde 2016, por isso o risco para emergência de outras doenças antes controladas é maior caso essas coberturas não se elevem. Por exemplo, no ano passado ocorreram casos de difteria na região norte do país também importados da Venezuela. A poliomielite também preocupa as autoridades Brasileiras e internacionais já que ocorreram surtos da doença em 4 países este ano. Num mundo altamente globalizado, em que as fronteiras estão cada vez mais próximas, é necessário todo o cuidado para evitar o alastre das doenças infecciosas.

Por isso, é muito importante manter a carteira de vacinação atualizada. O Programa Nacional de Imunizações conta hoje com 19 vacinas para 20 doenças contemplando desde as crianças até os idosos.

CB: Sabemos que existe um fenômeno mundial conhecido como “movimento antivacinas”. Em alguns países como Austrália, Estados Unidos e Espanha, ele tem ganhado adeptos. É um movimento que vincula a vacinação ao autismo. Você poderia nos explicar como surgiu esse movimento e se existe uma base científica para ele?

AA: O mito de que vacinas causam autismo surgiu, principalmente, após uma publicação do médico Wakefield no The New England Journal of Medicine, relacionando falsamente a vacina do sarampo e o aumento de casos de autismo. A publicação foi desmentida pelo resultado de vários outros estudos realizados em todo o mundo, e o artigo de Wakefield foi o primeiro a ser retirado desse importante jornal científico.

É importante que as pessoas saibam que, antes de serem licenciadas para uso, as vacinas passam por rigorosos testes científicos que são acompanhados de perto por diversas agências reguladoras como a ANVISA. Somente após a aprovação agências, as vacinas são liberadas para uso e, mesmo assim, continuam sendo monitoradas para garantir a segurança da população.

O movimento antivacinas cresce em outros países baseado em dados ditos científicos, mas que não são considerados confiáveis ou que até mesmo já foram desmentidos por outros estudos realizados. Essas informações falsas são propagadas pelas fake news. Por isso, o Ministério da Saúde hoje realiza uma forte campanha contra essas notícias falsas ligadas a saúde e as vacinas. Consulta sobre os principais mitos e verdades ligadas as vacinas estão disponíveis no site oficial do Ministério.

CB: É possível mensurar o impacto desse movimento no reaparecimento de determinados surtos ou epidemias?

AA: Aqui no Brasil esse movimento ainda não ganhou uma força expressiva, mas é possível visualizar o impacto do movimento em outros lugares do mundo. Por exemplo, há atualmente um surto de rubéola na Austrália relacionada ao movimento. Também vários surtos de sarampo que aconteceram nos Estados Unidos e no continente europeu. Na Europa ocorreu um aumento de 400% dos casos da doença e foi relacionado a ações do movimento antivacinista.

CB: Esse movimento existe no Brasil?

AA: O movimento no Brasil ainda é pequeno, mas as autoridades já se preocupam, principalmente pela importante queda na cobertura das vacinas. Essa queda pode estar relacionada a várias razões como a percepção enganosa dos pais de que não é preciso mais vacinar porque as doenças desapareceram; o desconhecimento de quais são os imunizantes que integram o calendário nacional de vacinação, todos de aplicação obrigatória; o medo de que as vacinas causem reações prejudiciais ao organismo; o receio de que o número elevado de imunizantes sobrecarregue o sistema imunológico; e a falta de tempo das pessoas para ir aos postos de saúde, que funcionam das 8h às 17h só nos dias úteis. Visando combater essas possíveis causas, o Ministério da Saúde já elaborou diferentes ações como o portal contra as fake news; novas campanhas publicitárias para demonstrar a importância da vacinação; treinamento para os profissionais das salas de vacinação para orientação da população; e a realização de campanhas de vacinação além do horário regular de expediente das unidades de saúde.

CB: Qual a principal causa para o reaparecimento dos casos de sarampo aqui no país?

AA: Como já mencionei antes, a principal causa para o reaparecimento dos casos de sarampo no Brasil foi a queda na cobertura vacinal contra a doença. Pelo fato de o sarampo ser uma doença altamente contagiosa é necessário que 95% da população brasileira esteja imunizada. Esse valor de cobertura garante o fenômeno de imunização de rebanho, protegendo assim pessoas que não podem ser vacinadas por possuírem algum tipo de imunocomprometimento ou impossibilidade de ser vacinado.

A Organização Pan-americana de Saúde já alertou as autoridades brasileiras que se até fevereiro de 2019 o surto da doença não estiver contido o Brasil irá perder o certificado internacional de eliminação da doença, conquistado em 2016. Para evitar isso é necessário que população procure as salas de vacinação e verifique se já está imunizada. Assim, evitaremos o surgimento de novos casos da doença.

CB: Com relação as doenças “sazonais” (tropicais), como Dengue, Chikungunya, Zica, existe alguma previsão para elas no próximo ano, tendo em vista que na temporada de chuvas se registram mais casos?

AA: O próximo ano será influenciado pelo fenômeno do El Niño, ocasionando um aumento no volume de chuvas em várias áreas do país. Dessa forma, diversos especialistas já alertam para um aumento do número de casos dessas doenças. Surtos de Chikungunya já são registrados em vários lugares do país. Já para a dengue a preocupação está relacionada com o aumento da circulação de subtipos virais que apresentaram poucos casos em anos anteriores, como o vírus tipo II. Dessa forma, mais pessoas ainda não possuem imunidade contra esses outros subtipos e isso pode levar a um aumento no número de casos da doença. Já a zika não apresenta um aumento no número de casos, mas preocupa principalmente as gestantes devido a síndrome do vírus zika que pode causar problemas nos fetos.

CB: Diante disso, como caminhoneiros e familiares podem se prevenir?

AA: A primeira recomendação é checar o calendário vacinal e verificar se está atualizado. Se ficou na dúvida se já tomou alguma vacina se dirija a sala de vacinação mais próxima e vacine-se. Essa orientação é dada pelo Programa Nacional de Imunizações.

Já para as doenças como a Dengue, Zika e Chikungunya algumas medidas preventivas são fundamentais como uso de repelentes (individuais e ambientais) e o combate aos focos do mosquito. Para as gestantes, que não devem utilizar o repelente, a recomendação é a utilização de roupas de cores claras que protejam o corpo contra a picada dos mosquitos e que seja realizado acompanhamento médico durante o pré-natal.

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