Brasil tem casos raros de autopeças competitivas

PEDRO KUTNEY, AB

Em meio ao ambiente dominado por baixa produtividade e competitividade inexistente, chama a atenção o desempenho de alguns raros fornecedores brasileiros de autopeças que estão conseguindo resultados positivos e, mais surpreendente ainda, não só no mercado interno, mas também com suas fábricas instaladas no exterior. Sabó e Iochpe-Maxion são dois desses pontos fora da curva de baixa, que apresentaram suas receitas de sucesso noPainel de Competitividade realizado durante o 22º Congresso SAE, evento que reuniu representantes da engenharia automotiva até quarta-feira, 8, no Expo Center Norte, em São Paulo.

Não por acaso, a receita do sucesso de ambas é bastante parecida, envolvendo principalmente investimento focado em tecnologia e qualidade de seus produtos, modernização e automação de fábricas, profissionalização da gestão com adoção de padrões de governança corporativa e internacionalização. “Se não fosse nossa estratégia de investir na melhoria contínua das operações, desenvolvimento de produtos com maior valor agregado e internacionalização de nossa presença, teríamos o mesmo fim de várias outras empresas do setor no Brasil, que nos anos 90 foram compradas por multinacionais”, avalia Lourenço Agnello Oricchio Jr., diretor geral da Sabó Américas e vice-presidente para os Estados Unidos. Ele cita, entre muitos outros casos, a Cofap, comprada pela Magneti Marelli, a Nakata, hoje pertencente à Dana, e Metal Leve, adquirida pela Mahle.

A Sabó, tradicional fornecedora de juntas de vedação fundada em 1945, fez justamente o contrário: não quis ser comprada e foi às compras. As exportações começaram em 1970 para a GM Opel na Alemanha e, desde então, o processo de internacionalização não parou mais. Hoje os produtos são vendidos em mais de 40 países e a empresa está presente em muitos dos centros de desenvolvimento das principais montadoras no mundo.

A partir de 1992 começaram as aquisições no exterior, primeiro com a Todaro na Argentina. Depois, no ano seguinte, foi a vez da Kako na Alemanha – que deu origem às cinco fábricas hoje em operação na Europa, três na Alemanha, uma na Hungria e outra na Áustria. Em 2007 o grupo ergueu sua própria planta nos Estados Unidos e, em 2008, na China. A Sabó domina hoje 70% do mercado de fornecimento direto de retentores e juntas às montadoras no Brasil, tem 40% dos pedidos na Europa e de 2% a 3% na América do Norte. “Existe também grande potencial na China, onde ainda estamos começando”, acrescenta Oricchio.

Apesar da operação aparentemente bem-sucedida, o executivo lembra que a Sabó também padece dos mesmos problemas enfrentados por outras fabricantes de autopeças no País. “Nossas fábricas no exterior são mais competitivas do que as duas instaladas no Brasil, porque aqui existe o problema de aumento salarial sem compensação de produtividade. Por isso estamos automatizando mais nossa unidade em Mogi Mirim. Já alcançamos 30% a 40% desse objetivo, com a instalação de linhas automáticas comandadas por um só operador que produzem 10 mil peças por dia. Sem isso não dá para ser competitivo”, diz.

Ele também insiste no investimento constante em produtos inovadores, com maior valor agregado. Exemplo disso são vedações com redução de 30% de atrito, que melhoram a eficiência de elementos mecânicos dos motores, ou retentores desenvolvidos com nanotecnologia capaz de juntar elementos antagônicos como alumínio e borracha em uma só peça. Atualmente a Sabó investe no desenvolvimento de vedações por repelência, com superfícies tratadas com nanotecnologia inspirada na folha de lótus, que repele água e poeira. “Esse tipo de tecnologia poderá ser usado em superfícies pequenas de retentores ou mesmo cascos de barcos ou em aviões”, destaca Oricchio.

A Sabó mantém convênios de pesquisa tecnológica com universidades no Brasil como USP, Unesp e Unicamp, e MIT nos Estados Unidos. Também tem parcerias de desenvolvimento com empresas como Pirelli, Eletrocell e Ballard. Com as duas últimas, desenvolve componentes de células de combustível, que geram energia para carros elétricos a partir da reação química do hidrogênio.

FOCO NO CORE BUSINESS

Após entrar em muitos negócios do setor automotivo nos anos 1980, na década seguinte o grupo Iochpe-Maxion decidiu centrar esforços nos negócios que a diretoria considerava dominar melhor. Foram vendidas as unidades de fabricação de máquinas agrícolas e motores, de maior complexidade industrial, para redirecionar os investimentos à metalurgia mais pura, na produção de componentes estruturais (como longarinas, chassis e carrocerias) e rodas.

“Foi como descascar uma cebola, tirando camadas para focar em um só core business e negócios adjacentes, para usar da melhor forma nossos conhecimentos”, contou Dan Ioschpe, presidente do grupo. Também foi forte a internacionalização por meio de compras e associações no exterior. Após a aquisição de fábricas no Brasil, Europa, Estados Unidos e China, hoje a Iochpe-Maxion é a maior fabricante de rodas do mundo.

“Focamos em produtos com crescimento orgânico. Mesmo que com avanço pequeno, nossos clientes estão sempre aumentando as compras ano a ano”, conta Ioschpe. “Traçamos o objetivo de duplicar o tamanho da companhia a cada cinco anos.” Mas foi bem mais rápido do que isso. O faturamento de R$ 1,16 bilhão em 2009 saltou para R$ 5,3 bilhões em 2012, em crescimento de nada menos que 357%. No primeiro semestre deste ano as vendas somam R$ 3 bilhões, contra R$ 2,5 bilhões no mesmo período do ano passado, anotando expansão de 20%. “Apesar de alguma desaceleração ais recentemente, entendemos que veremos mais do mesmo por muitos anos.”

Hoje 40% das vendas do grupo são no Brasil e 60% no exterior, sendo 29% na Europa, 23% na América do Norte e 8% em outras regiões. “Provavelmente essa divisão continuará a mesma nos próximos anos, pois o crescimento é parecido nos mercados onde atuamos”, avalia o executivo.

Ioschpe concorda que o meio ambiente brasileiro não é convidativo aos negócios, enumerando os obstáculos ao crescimento: matérias-primas com preço superior ao exterior, custos trabalhistas altos e em expansão, custo financeiro alto, câmbio apreciado e insegurança jurídica. Nesse sentido, ele avalia que o Inovar-Auto e a provável publicação do Inovar-Autopeças poderão ajudar a recuperar parte da competitividade perdida: “Sem isso será difícil atingir os objetivos desses programas”, diz.

REALIDADE DURA

“Infelizmente existem poucas Sabós e Iochpes no Brasil. A discussão de competitividade precisa começar já, principalmente nos fornecedores em níveis mais baixos da cadeia, os tier 2 e 3, ou os fornecedores no País não conseguirão recuperar a rentabilidade perdida”, resumiu Stephan Keese, sócio-diretor da consultoria Roland Berger.

Antes de ouvir os cases das duas raridades brasileiras do setor, o consultor apresentou dados bem mais duros sobre a competitividade do setor. Nos últimos cinco anos, os salários subiram, em média, 8,8% nas montadoras e 8% nos fornecedores. A margem de lucro antes de impostos e custos financeiros caiu para 6,5% em 2012 no conjunto das empresas da cadeia de suprimentos. Em dez anos, o valor da hora trabalhada nas linhas de produção cresceu 239%, enquanto os ganhos de produtividade avançaram apenas 21%.

“O problemas não é o salário alto, o que não pode é a produtividade tão baixa. Em países como Alemanha e Itália o custo da mão-de-obra também é elevado, mas lá esse custo é compensado com ganhos de produtividade nos processos industriais e com a agregação de valor aos produtos, coisa que não acontece no Brasil”, avalia Keese.

Para o consultor, somente com uma abordagem holística do negócio, buscando ganhos de produtividade em todas as áreas, com maior automação e investimento em novos produtos, as empresas de autopeças conseguirão sair do buraco no Brasil. É exatamente o que fazem Sabó e Iochpe-Maxion.

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