Ford dá adeus ao ABC após 52 anos

Aos 20 anos, Mauro Sérgio Rovaron foi contratado pela Ford para embalar peças, dando sequência a uma tradição da família. A avó materna, Rosa, trabalhou como copeira na Willys e, quando a empresa foi adquirida pela Ford, em 1967, permaneceu no cargo.

Quando ela estava para se aposentar, o filho Mauro foi contratado para trabalhar na linha de produção, em 1971, e só deixou a empresa 36 anos depois, já aposentado.

“Eu nasci um ano depois da contratação do meu pai e sempre sonhei em trabalhar na Ford também; quando consegui a vaga, achava que ia seguir o mesmo caminho deles”, disse Rovaron, hoje com 47 anos e funcionário da área de logística. Após passar pela catraca da empresa na tarde de ontem, ele contou, com lágrimas nos olhos, que esperava ficar lá até a aposentadoria. “Era uma coisa de família”.

Poucas horas antes, o último caminhão saiu da linha de montagem, colocando fim a uma história de 52 anos da marca americana no ABC paulista. A Ford anunciou em março que sairia do negócio de caminhões e fecharia a fábrica.

Desde então, o Grupo Caoa, do empresário brasileiro Carlos Alberto de Oliveira Andrade, tenta comprar a fábrica, negócio que inicialmente foi conduzido pelo governador de São Paulo, João Doria, mas que está emperrado.

A unidade produzia também o Fiesta, que teve a produção encerrada em junho. A linha atual de veículos de passeio está concentrada na unidade de Camaçari (BA), onde também são feitos os modelos Ka e EcoSport.

Velório

“Hoje o clima na fábrica foi de velório, de muita tristeza, várias pessoas chorando”, contou Claudio Araújo Machado, de 45 anos e há 25 anos funcionário da Ford – nos últimos anos como membro do comitê sindical. Ele começou a trabalhar na unidade de caminhões no bairro do Ipiranga, em São Paulo. Em 2001, a montadora fechou as portas da filial e concentrou a produção no ABC paulista, onde produzia carros.

“O dia foi doloroso

A gente esperava que houvesse uma reversão por parte da empresa, mas infelizmente isso não ocorreu”, disse Eduardo Moura Araújo, de 29 anos, e há seis na empresa.

Morador da zona leste de São Paulo, casado e com dois filhos (um de um ano e outro de quatro), ele disse que a mulher está desempregada e que a esperança agora é que o Grupo Caoa fique com a fábrica.

Pai de cinco filhos com idades entre 2 e 11 anos, Giovane Alves da Silva, de 32 anos, teme pelo futuro. “Quando entrei aqui, há quase cinco anos, achei que teria todo o suporte para o futuro, mas agora saio sem saber o que vai ser dos meus filhos e da minha mulher, que dependem de mim.”

Silva mora em São Bernardo, em casa alugada, e também disse que o clima na fábrica ontem “era de velório mesmo”.

Para Adilson Moreira Lima, o choque foi grande, pois ele foi reintegrado à fábrica, por decisão judicial, há apenas uma semana. “E hoje fui demitido de novo.” Ele perdeu o emprego há dois anos, mas, como tinha adquirido doença profissional nos sete anos em que trabalhou na área de ferramentaria, recorreu à Justiça, que determinou a reintegração na última sexta-feira. “Eu já estava em um trabalho temporário da Honda, em Sumaré (SP), e saí para voltar para a Ford e acontece isso.”

Na sua opinião, “será um grande desperdício deixar uma fábrica desse tamanho largada”. Entre modelos que a fábrica produziu estão Escort, Maverick, Galaxie, Corcel, Del Rey, Pampa, Ka e Fiesta.

Quando a Ford anunciou o encerramento das atividades, a fábrica do ABC tinha 2,8 mil funcionários. Parte deles aceitou pacote de demissão voluntária (PDV) e até ontem restavam 650 na linha de produção – cujos contratos serão encerrados até a próxima semana. Outros mil da área administrativa serão transferidos para um escritório na capital paulista em março do 2020.

Indenização

Todos os demitidos da área de produção vão receber indenizações de 1,5 a 2 salários extras por ano trabalhado como compensação, dinheiro que, segundo os próprios trabalhadores, será suficiente para se manterem por algum período. “Comecei a distribuir currículos há dois meses”, informou Rafael Lasso de la Vega, de 28 anos. Ele estava na Ford há seis anos e trabalhava como auditor de qualidade.

Formado em Engenharia de Produção e cursando MBE em gestão de processo, ele contou que seu objetivo era “crescer na empresa, ter um cargo melhor e salário maior”. A mulher está grávida do primeiro filho.

Em nota, o presidente da Ford, Lyle Watters, agradeceu aos funcionários “pelo profissionalismo e dedicação durante vários anos” e afirmou que a decisão de encerrar as atividades foi difícil, mas necessária para a reestruturação dos negócios do grupo.

(O Estado de S. Paulo/Cleide Silva)

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