Chico da Boleia conversa sobre a Lei 12.619 com José Machado, diretor da ATR Brasil.

Confira na íntegra a entrevista

Chico da Boleia: Mais uma vez vamos conversar sobre a Lei 12.619. A Lei ainda está em vigor, mas existem muitos setores reclamando  e tentando fazer um lobby para mudá-la. O Sr. acha possível mudar alguma coisa na Lei 12.619, que é a Lei do Motorista?

José Machado: Existem várias mudanças que são impossíveis de serem realizadas, mas existem algumas mudanças que eu vejo como possíveis. Por exemplo, tem uma coisa que fazia parte do Projeto de Lei que foi vetado pela Presidenta e que eu acho fundamental falar porque estou sentindo na pele na hora do controleque é a questão da jornada semanal de 36 horas. O PL original previa que o empregado poderia acumular 1, 2 ou 3 semanas de trabalho sem descanso e isso foi vetado. Então fica vinculado que toda semana o motorista tem que descansar 36 horas. Isso realmente é muito difícil de se controlar. Existe, por exemplo, aquele caminhão que está lá em outra cidade, há 500km ou 1000km de distância de sua casa. Nesse caso, o que se vê é que o caminhoneiro não quer ficar 36 horas longe, seja no hotel, seja na cabine, seja no posto ou onde for, descansando. Ele quer ficar na casa dele. Então, se você tivesse na Lei aquele artigo que foi vetado que dizia que ele poderia acumular o descanso em até 3 semanas e depois descansar cumulativo, satisfaria o empregado e o empregador. Porque o empregado trabalhou, voltou, vai descansar 108 horas na casa dele e vai poder lavar o caminhão, dar manutenção, planejar outra viagem. Enfim, essa é uma mudança que seria salutar, que não prejudicaria ninguém e que inclusive fazia parte do texto original da Lei que foi vetado. Mas existem 2 ou 3 coisas que estão sendo pedidas nessas discussões, que também não vem ao caso. Mas que eu fico, honestamente, preocupado, porque eu estou rodando pelas estradas e vejo que a desobediência dessa Lei acontece de forma flagrante. Você vê que não está havendo o descanso e que a Lei não está sendo cumprida. Entao se a pessoa não acredita nas multas, no âmbito do Conselho Nacional de Trânsito, tudo bem. Mas nossa maior preocupação não é essa e sim a parte trabalhista. Como eles (empresários) vão se defender numa eventual reclamação trabalhista no futuro? A partir do momento em que uma empresa perder uma ação trabalhista, vai haver fila de reclamações na Justiça do Trabalho e empregadores não terão como se defender.

Chico da Boleia: Nós temos na área de transporte inúmeros tipos de carrocerias, rotas e produtos a serem transportados. Não fica muito difícil colocar toda essa diversidade dentro de uma só Lei?

José Machado: É outra coisa que se discute. Eu ouvi a disposição de motivos de quem está pleiteando mudanças lá em Brasília. Inclusive a nossa entidade e outras também estão participando das discussões. Eu não sei o que será aprovado ou não. Isso que você está levantando é uma das coisas. Então: cadê o pátio de descanso com tomada para carga perecível?  Uma coisa é o trecho Rio-São-Belo Horizonte, outra coisa é Belém-Brasília-Roraima. Então isso tudo está sendo discutido para que aconteçam algumas adequações nesse sentido. Na prática, aqui dentro da empresa a gente sente isso. As 11 horas, por exemplo, são necessárias. Mas aquelas 36 horas são complicadas. Porque se é uma rota que ele está passando na frente da empresa e pode trocar de motorista, tudo bem. Mas e se ele parou há 1000km de distância, como faz? Por isso que eu acho que poderia acumular essas 36 horas pra ele descansar depois, sendo que o máximo seria de 108 horas. Aí tem que dar um jeito do caminhão voltar e ele descansar em casa. Porque o caminhoneiro quer descansar com a família. Não adianta ele ficar 36 horas num posto de gasolina. Ele vai ficar fazendo o que? Vai ficar bebendo e pensando em coisa errada!

Chico da Boleia: Pela experiência, quanto tempo o Sr. acha que leva pra essa Lei ter o tempo de maturação e começar a ser efetivamente praticada?

José Machado: Olha, o tempo é diretamente proporcional à fiscalização. Eu estou cansado de ver leis que não funcionam nunca porque não existe fiscalização. Em alguns setores como o agronegócios, por exemplo, não existe Vale Pedágio, e é uma Lei. Mas nunca foi fiscalizado ou se foi, foi esporadicamente. Outro exemplo é o pagamento eletrônico de fretes. Qualquer um pode ir e constatar: isso está sendo cumprido? Modéstia a parte eu estou dizendo isto porque a nossa empresa aqui cumpre essa determinação rigorosamente, mas fica até difícil porque a competição fica desleal já que a maioria não cumpre. Então se a fiscalização agir, esse cumprimento vai ser rápido. Mas se ficar nesse marasmo, não vai funcionar nunca. Vai funcionar depois que quebrar alguns aí porque a legislação trabalhista vai agir. Se o empregado for reclamar, a legislação trabalhista vai agir e isso vai custar caro para o empresário. Mas aí eu acho que vai ser um pouco tarde pras pessoas acordarem.

Chico da Boleia: Efetivamente o Sr. hoje está criando dentro da empreso a metodologia para cumprir a legislação. O Sr. consegue medir quantos por centro isso impactou no preço do frete?

José Machado: É difícil pra você convencer o usuário pra repassar essas coisas. Por exemplo, nas vias mais curtas, onde existe uma certa frequência de trajetos, de ida e de volta, você pode fazer um alojamento lá na ponta. Então você impactou no seu custo com aqueles motoristas a mais que você colocou lá para fazer a descarga, o carregamento na outra ponta, enquanto o motorista descansa. Isso tudo custa. Agora no geral o que aconteceu é que perdemos muito na produtividade do caminhão. No geral, tivemos uma queda de 40% na produtividade dos caminhões. Mesmo considerando os reajustes de frete em função disso, se você pegar um caminhão que faturava R$50 mil por mês, hoje ele fatura R$30 mil. E aí as pessoas dizem: “Ah mas vocês já rodavam à noite, 24 horas?”. Não, não tinha nada disso! Os nossos caminhões já eram, antes da lei, bloqueados das 22 horas as 6 horas da manhã.

Chico da Boleia: Como o Sr. vê o transporte rodoviário de cargas para os próximos 5 anos?

José Machado: Eu vejo com preocupação! O governo está incentivando muito a venda de caminhões por conta de juros até negativos do BNDES. A concorrência é acirradíssima. Eu estou falando no setor onde eu opero, que é o setor de agronegócios. A concorrência chega a ser desleal, porque um controla, o outro não, um recolhe (imposto) o outro não. Eu estou preocupado e apreensivo, porque acho que teremos problemas de liquidez. Porque, por exemplo, a questão do pagamento eletrônico: isso gerou para as empresas – estou falando com conhecimento de causa – um desencaixe muito maior do nosso capital de giro.  Eu acho que no setor de agronegócios tem muita gente que não vai aguentar. Porque se a fiscalização apertar vai pegar no controle da jornada, no pagamento do frete, tem gente que continua trabalhando do mesmo jeito que era antes. Tem gente, inclusive, que não está cumprindo o controle da jornada. Se a pessoa não acordar ela vai sofrer ou com a fiscalização ou com a própria Justiça do Trabalho mais pra frente.

Redação Chico da Boleia. 

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